Será a perceção distorcida da mão uma adaptação funcional do cérebro?

Será a perceção distorcida da mão uma adaptação funcional do cérebro?

 

A perceção que temos do nosso corpo é construída pelo cérebro e nem sempre corresponde à realidade física. Longe de ser um espelho fiel, esta representação interna apresenta distorções sistemáticas que, mais do que simples erros, podem ter um valor funcional, sobretudo no contexto do controlo motor. A mão, órgão central na interação com o mundo, oferece um modelo ideal para explorar estas distorções.

Num estudo recente, uma equipa de investigação liderada por Elisa Ferrè investigou como 20 adultos saudáveis percebem o volume e o peso da sua própria mão. Utilizando tarefas psicofísicas, os participantes estimaram o volume da mão com recurso a representações visuais ajustáveis, e o peso por comparação com massas suspensas.

Os resultados revelaram uma sobrestimação média do volume em 24% e uma subestimação do peso em 25%. Com base nesses dados, os pesquisadores calcularam a densidade percebida da mão: cerca de 0,75 g/cm³, o que é 31% menor que a densidade real. O cérebro parece manter uma representação estável, embora imprecisa, da densidade da mão. A perceção de peso e volume ajusta-se a essa densidade percebida, em vez de serem estimadas de forma independente.

Esta perceção reduzida do peso pode facilitar o planeamento e a execução dos movimentos, tornando-os mais fluidos e eficientes — como se a mão fosse mais leve e fácil de mover —, o que se traduz num menor esforço percebido. Este princípio já inspira aplicações em áreas como a robótica e a reabilitação, onde a redução da sensação de esforço contribui para melhorar o controlo motor e a integração de próteses.

Este estudo foi publicado na revista científica Cortex, no artigo Underestimation of human hand density, no âmbito do projeto de investigação 41/20 - Luminous dancing fairies in weightlessness: How gravity shapes conscious experiences, apoiado pela Fundação BIAL.

 

Abstract

Our body is a 3D object, with physical properties such as volume, weight and density. Our brain has to represent these physical properties in the perception of one's own body and body parts. It has been shown that we have a distorted representation of hand size and hand weight. In this study, we investigated the perception of hand volume without experimental alterations. We found that people overestimate the volume of their hand on average by 24%, relative to its actual volume, and we replicated the hand weight underestimation by 25% relative to its actual weight. With a precise estimation of perceived hand volume and hand weight, we calculated perceived hand density. The mean perceived hand density was .75 g/cc, comparable to foam beads, an underestimation of 31% of actual hand density. Our findings suggest that the brain maintains a stable representation of hand density at a low level, with perceived hand weight and volume adjusting accordingly, rather than being estimated independently. Our results add to a body of evidence showing that the representation of our body parts is inherently distorted. This study contributes to the understanding of how volume, weight and density are estimated in the perception of body parts, and the relationship between the representations of physical bodily properties.